domingo, 28 de setembro de 2008

Extinção Prematura


Por vezes alterco-me com questões importantes, questões nascidas da mente de um sofredor de insónias, são horas passadas em divisões disformes reflectindo acerca, por exemplo, da razão porque todos os animais com estilo estão extintos. É uma questão saudável de se considerar, soa a uma piada surrealista, porque é que toda a fauna exótica a sério bateu as botas. Será uma questão cultural, e por isso exótica, por estar extinta e assim fora do nosso alcance?
Não me parece!
Onde é que estão as galinhas gigantes?
E os lobos marsupiais?
E até os dodós são mais interessantes que um ganso aleatório.
Parece que estamos a viver num universo saído da mente de um Deus com inclinações de funcionário de repartição pública e um sentido de humor duvidoso.
“Galinhas! Que sejam pequenas, portáteis e gostem de milho! E boas no churrasco, já agora, para compensar os vírus que criei na terça-feira.”
Um pouco insosso, não acham?
Há quem sinta saudades de Salazar, eu sinto saudades do T-Rex.
Um certo fascínio pelo que se perdeu.
Pelo que nunca vou ver em primeira-mão, pelo que nunca vou poder apreciar nem sequer em segunda-mão.
E que se lixem os gansos.

domingo, 21 de setembro de 2008

Tudo o que me adormeça de ti


Tudo o que me adormeça de ti, tudo o que me faça esquecer a tua pele.
Queria aprender os teus ritmos, as tuas marés, os teus inventos, os teus padrões de pensamento e os teus processos de criativos.
Aprendi algo, aprendi que nunca estou verdadeiramente livre, que estou sempre pronto a ser aprisionado, magnetizado, enleado numa teia de novidades estonteantes, de pequenas ovelhas como nuvens e gnomos viajantes.
Quero estar narcotizado até voltares, carnalmente, em explosões cabaré-punk.
Tudo o que me adormeça de ti, tudo o que me faça esquecer a tua pele.
Mas tu não voltas, pois não?
Porque isto só foi um momento.
Porque isto foi uma tentação.
Porque isto não podia ser mais.
Porque isto não podia ser mais agora.
Porque.
Porquê?
Não guardo qualquer remorso, nenhuma dor maior, nenhum ódio vermelho.
Queria que me vendesses a tua alma, mas fui cego, esqueci-me que a amava livre, que era isso, a tua liberdade, o que me mantinha atento, pronto a ouvir, em transe nas tuas palavras.
Não quero a tua alma, pelo menos agora, apenas quero reflexos dela e um pouco do teu desassossego.
Tudo o que me adormeça de ti, tudo o que me faça esquecer a tua pele.
Mesmo que tenhas quebrado o meu Japa Mala, mesmo derrubando o meu arcano carvalho, mesmo interrompendo o meu mantra, mesmo assim não vejo em ti pecado.
Em fim, pensamentos, no meio disto só me arrependo de não te ter beijado uma última vez.
Minto.
Isso seria demasiado final.
E não consigo esquecer a tua pele.
E o sono não voltará.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Dualismos

Repara, a minha natureza é de uma dualidade peculiar, brutalidade e carinho desfasados por minutos simbólicos que nunca consegui bem compreender.
Uma besta criadora, um escritor, por vezes sem polegares oponíveis, rabiscando mundos de forma crua, observando calado, para sempre naquele banco de cimento sujo de outrora.
Preciso de musas, sem pudor digo que sim, sem vergonha digo que preciso de viver para escrever e tu és ainda uma página branca de mais, uma página que preciso de rabiscar e ler, pintalgar com crípticas ideias que nunca serão mais que ideias, que nunca serão mais porque todos temos que pagar uma portagens de sangue e suor neste mundo, burocracia emocional, medos de tempos passados como carimbos num passaporte.
Por vezes contemplo o suicídio social, para poder apagá-los, mudar de nome, de cidade, de vida, talvez algures para norte, para um sitio mais frio que este, longe de verões demasiado compridos. Nunca seria o suficiente.
Assim, ainda assim, abordo de forma pueril, inocente o mundo a minha volta, abordo-o com uma força, com um ímpeto, como se fosse um miúdo, como se tudo fosse novo.
A minha força de vontade roça a loucura por vezes, insensatez pura, impulsos mal comedidos, mas é assim que me sinto feliz, completo.
Não devia precisar de musas, consumem-me sempre, não devia porque as minhas musas são sempre decadentes, coisas do passado, de conjugação em pretérito (muito pouco) perfeito.
Gostava de pensar que és diferente, mas o universo dá-me sempre cartas do mesmo baralho, a exacta mesma mão de sempre.
E o meu mundo interior é sempre tão vasto, não devia por a minha alma nas mãos de outros seres humanos, tão integralmente, tão fatidicamente.
No entanto, preciso de te descobrir.
No entretanto, preciso de te sentir.
Preciso de saber o que és.
Por mais que possa doer.
Calma!
Digere.
Racionaliza.
Por força da lógica distorce verdades perdidas entre frases sem sentido, comete erros, mas comete algo, comete-te a algo.
Ordo ad Chao
Ordo ab Chao

domingo, 7 de setembro de 2008

LIberdade

Para ti, liberdade
Amo-te nos teus momentos plácidos, no cheiro de papel velho, no embate mental, na clareza da lógica e nas perdas de sanidade temporárias, intensas e sonoras.
Ouço os teus suspiros, ideias e gritos, sabem-me ao mesmo, no prazer e na dor, marcados e dissonantes, sabem-me a vida, a violência.
Sem ânsias, contemplando furacões, livres de preconceitos destroem carvalhos centenários como quem esmigalha egos de colegiais novas de mais para perceber verdades experimentadas, destruindo casas, buracos desses artísticos macacos como se fossem pequenos lápis, roídos e enfraquecidos por horas de escrita sem sentido.
Amo-te liberdade, todas as tuas faces, representações, pictogramas desgastados e limpas ilustrações estilizadas, para os meus olhos são o mesmo. Do meu ego quero que uses todo, não me leves nada, abusa de mim, estas dores não existem, estes turbilhões são para ser admirados, nunca me poderiam magoar, engrandecem-me, enlouquecem-me, fazem me esquecer de mim, vivo como poucas vezes.
Não te peço mais, só quero partilhar contigo o caos.
Liberdade e caos, amantes intangíveis, admiro-vos em todos este processo de decadência planeada.
Quero-te a ti, tudo o que o tempo permita, tudo o que o amontoado de células e conceitos a que chamo Eu o permita. Todo o que o tempo me permita dar, tudo o que o tempo não arrastar nas suas águas, tudo o que poder colocar em palavras e movimentos.
Posso cantar muito bem canções doutros dias negros, posso articular palavras usadas em momentos pedantes. Posso criar, mas não me posso deixar aprisionar. Não me posso deixar ficar por esses corredores de palavras que inspiram nas massas segurança, sabes que todas não valem o oxigénio gasto para as expirar, por mais bela que seja a boca que as possa proferir.
Tenho que escolher-me a mim, a minha verdade, as minhas paixões internas, sabes que essas nunca me abandonaram, essas nunca me deixarão enquanto as sinapses do meu cérebro ainda dispararem.
E lembra-te, nunca serei totalmente teu.
Nunca serei mais do que eu.